Tino e Jane não gostam de pensar nas contas, compram sem planejar, esbanjam mimando os filhos e ignoram conselhos profissionais sobre como usar bem o dinheiro. O resultado: despencam da riqueza para a pobreza. O casal, embora fictício, ilustra bem muitos dos maus hábitos que encontramos nas famílias ao lidar com dinheiro. Esses hábitos misturam traços de família, o jeito do brasileiro e limitações do cérebro humano. Nenhum deles é insuperável.
Para ajudar a superá-los, ÉPOCA ouviu investidores prósperos, consultores financeiros e pesquisadores de comportamento. A partir das entrevistas, selecionamos as atitudes mais mencionadas. São as que mais fazem diferença para as famílias conseguirem enriquecer. Sobressaíram os conselhos que recomendam atenção ao básico: viva dentro de suas possibilidades, comece a poupar logo, mantenha-se em investimentos compreensíveis.
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Para ilustrar esses hábitos, convidamos os atores Danielle Winits e Leandro Hassum. Eles interpretam Tino e Jane na comédia Até que a sorte nos separe, uma enciclopédia cinematográfica sobre maus hábitos financeiros. “Na organização das contas, comece com a técnica que melhor servir a você. Pode ser planilha, dinheiro separado em envelopes, gavetas, caixa de sapato”, diz o orientador financeiro Gustavo Cerbasi, colunista de ÉPOCA e autor do livroCasais inteligentes enriquecem juntos, que inspirou o filme. “O importante é poder comparar o que você prevê com o que acontece mesmo.” Para facilitar as mudanças, não confie só na força de vontade. Há muita ajuda disponível na tecnologia, na psicologia e nos prestadores de serviços financeiros. Nossas dicas estão abaixo.
1. Organize-se. Dá menos trabalho
Preguiça, todo mundo tem alguma: de acordar cedo, de fazer exercício, de voltar a estudar, de fazer dieta e (uma campeã entre as causas de bocejos) de pensar em cuidar melhor do dinheiro. Se seus hábitos de preguiçoso fazem você trabalhar mais, e não menos, você vem sendo um preguiçoso incompetente. É o que ocorre com quem se esquece de guardar dinheiro para a viagem de férias (e precisa resolver isso depois, às pressas) ou deixa passar a data de pagamento de contas (e tem de fazer isso em algum momento seguinte, com mais custo e mais trabalho). Torne-se um preguiçoso melhor e ponha seu dinheiro para trabalhar por você. Uma pequena meta é garantir que você guarde algum dinheiro todo mês. Entre as opções estão os planos de previdência, que exigem depósito mensal sem que você tenha de lembrar disso, e as aplicações automáticas regulares em poupança ou fundos – basta programar.
Preguiça, todo mundo tem alguma: de acordar cedo, de fazer exercício, de voltar a estudar, de fazer dieta e (uma campeã entre as causas de bocejos) de pensar em cuidar melhor do dinheiro. Se seus hábitos de preguiçoso fazem você trabalhar mais, e não menos, você vem sendo um preguiçoso incompetente. É o que ocorre com quem se esquece de guardar dinheiro para a viagem de férias (e precisa resolver isso depois, às pressas) ou deixa passar a data de pagamento de contas (e tem de fazer isso em algum momento seguinte, com mais custo e mais trabalho). Torne-se um preguiçoso melhor e ponha seu dinheiro para trabalhar por você. Uma pequena meta é garantir que você guarde algum dinheiro todo mês. Entre as opções estão os planos de previdência, que exigem depósito mensal sem que você tenha de lembrar disso, e as aplicações automáticas regulares em poupança ou fundos – basta programar.
O consultor Humberto Veiga chama isso de “pagar a si mesmo antes de tudo”. A meta seguinte é colocar as contas em débito automático e conferir com o banco os alertas que você pode receber por mensagem de celular ou e-mail sobre gastos, dinheiro parado na conta-corrente e investimento.
2. Pense nos fins, não no dinheiroSe você poupa, parabéns. Mas outro hábito danoso pode tirá-lo do rumo: a falta de objetivos claros. Acumular sem foco não é um mal só de brasileiros. Tem a ver com instintos bem primitivos, desenvolvidos pela necessidade de nossos antepassados de guardar comida. Guardar dinheiro pensando só em valores, porém, tende a ser desanimador. Facilmente descamba para o uso ruim daquilo que foi poupado. Se você está sem objetivos concretos, tente defini-los aos poucos. A experiência deve ser boa, e não estressante. Não valem formulações vagas, como: quero viver bem na praia. Experimente: quero comprar uma casa de dois quartos na praia tal, daqui a seis anos. “A situação ideal é casar o entendimento das aplicações com objetivos palpáveis”, diz Jurandir Sell Macedo, consultor de finanças pessoais do Itaú e professor da Universidade Federal de Santa Catarina. O diretor da empresa alemã Cognitrend (que aplica neurologia e psicologia aos investimentos), Joachim Goldberg, sugere fragmentar os objetivos tanto quanto necessário – para meses e para anos, para saúde, família, viagem, compras. Desse bom hábito, decorrem boas consequências: a visão mais clara das prioridades, dos riscos e dos limites para seu bolso.
3. Pare de seguir a manada
No fim dos anos 1990, duas modas financeiras fizeram vítimas: o investimento em boi e avestruz. Por um momento, pareciam formas mais inteligentes, ousadas e bem informadas de ganhar dinheiro. Não eram. Episódios desse tipo, que arrastam levas de investidores a um comportamento destrutivo, ocorrem há séculos e continuarão existindo. Seguir rapidamente o comportamento do grupo foi outra adaptação do cérebro humano muito útil quando precisávamos fugir de predadores. A ela, somou-se um traço cultural: imitar tendências vistas em outros nos ajuda a lidar com a frustração, em caso de perdas, segundo afirma o neurocientista Armando Freitas da Rocha, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). O professor de psicologia e neurociência Scott Huettel, da Universidade Duke, faz outro alerta: quem tem dificuldade de decidir em outras áreas da vida frequentemente também acha difícil decidir sobre dinheiro – e segue mais facilmente a manada. Se não sabe o que está fazendo, evite seguir os outros. Prefira escolher uma estratégia de poupança compreensível para você e adequada a suas necessidades. E mantenha-se nela até que tenha planejado outra melhor.
No fim dos anos 1990, duas modas financeiras fizeram vítimas: o investimento em boi e avestruz. Por um momento, pareciam formas mais inteligentes, ousadas e bem informadas de ganhar dinheiro. Não eram. Episódios desse tipo, que arrastam levas de investidores a um comportamento destrutivo, ocorrem há séculos e continuarão existindo. Seguir rapidamente o comportamento do grupo foi outra adaptação do cérebro humano muito útil quando precisávamos fugir de predadores. A ela, somou-se um traço cultural: imitar tendências vistas em outros nos ajuda a lidar com a frustração, em caso de perdas, segundo afirma o neurocientista Armando Freitas da Rocha, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). O professor de psicologia e neurociência Scott Huettel, da Universidade Duke, faz outro alerta: quem tem dificuldade de decidir em outras áreas da vida frequentemente também acha difícil decidir sobre dinheiro – e segue mais facilmente a manada. Se não sabe o que está fazendo, evite seguir os outros. Prefira escolher uma estratégia de poupança compreensível para você e adequada a suas necessidades. E mantenha-se nela até que tenha planejado outra melhor.
4. Fuja do excesso. Ele viciaEm 2010, o neurocientista Jaak Pansepp, da Universidade do Estado de Washington, percebeu que o prazer do consumo vem de áreas do cérebro mais profundas do que se imaginava. Trata-se de uma manifestação do impulso primitivo que Pansepp chama de “busca”. Pense na excitação frenética de um roedor que acorda e sai em busca de alimento. O hábito de comprar sem controle é um dos mais perniciosos e mencionados por especialistas. Não confunda o prazer de uma compra desejada com o consumismo. No segundo caso, a satisfação com cada objeto comprado some rapidamente, e o prazer se desloca para a atividade de comprar. “Mesmo entre as famílias com renda maior, muitos acreditam que não há como fazer sobrar. Eles não admitem que fazem compras supérfluas”, diz Gilberto Poso, do banco HSBC. Se você percebe em si mesmo leves traços de consumismo excessivo, contenha-se aos poucos. Curta o que tem em casa e adie novas compras. Se sua situação for mais grave, experimente o ritual de desintoxicação sugerido pelo psicólogo evolutivo Geoffrey Miller, da Universidade Stanford: avalie suas compras recentes. Avalie seu carro. Doe dinheiro para caridade. Passeie no shopping center. Sem meios de comprar nada, só observando as lojas e consumidores.
5. Enxergue o que é necessário, não o que quer verNós, humanos, aprisionamo-nos continuamente a armadilhas mentais. Uma delas é a ancoragem em dados pouco ou nada relevantes (“a loja diz que o desconto é grande, então o preço atual é ótimo”). Outra é a crença na representatividade dos dados disponíveis (“meu primo lucrou com esse investimento, logo ele é ótimo”). São formas diferentes de dizer que, muito facilmente, prestamos atenção só ao que queremos e ignoramos outras informações relevantes. “Muita gente se vê como vítima de imprevistos o tempo todo ou conta com aumentos futuros, incertos, para começar a poupar”, diz Aquiles Mosca, estrategista de investimentos pessoais do banco Santander. Facilmente esquecemos de perceber gastos supérfluos e opiniões contrárias às nossas. Escapar completamente dessas armadilhas é impossível, porque precisamos frequentemente fazer escolhas rápidas. Mas é um hábito perigoso afundar nelas ao tomar decisões mais relevantes, relacionadas a grandes compras e investimentos de longo prazo. Rompa a armadilha com hábitos saudáveis: confira pontos de vista diferentes. Ouça sugestões e críticas de quem discorda de você.
6. Viva com o dinheiro. O seuComprar carro novo e viajar nas férias são vontades bem fáceis de entender. Elas ganham um embalo extra com a queda das taxas de juros, o aumento da oferta de crédito no país e a variedade das opções de financiamento, do crediário ao empréstimo pessoal. Nesse campo, as boas notícias param por aí. O brasileiro habituou-se a ignorar alguns grandes problemas. Primeiro, mesmo em queda, os juros no país, para o crédito, continuam altíssimos. Os investimentos à disposição não conseguem competir com as dívidas. Segundo, a oferta de crédito a cada cidadão avança mais rapidamente que seu aumento de renda. Ela entra em sua vida por frestas variadas, como o cartão de loja ou o novo cartão de crédito bonitão. “O brasileiro ainda esquece os juros e olha só se a parcela cabe no bolso. Com isso, compra um carro, e paga dois”, diz Samy Dana, doutor em finanças e professor da Fundação Getulio Vargas. “Quanto mais fácil é o dinheiro, mais caro se torna. Por isso, o cheque especial tem juros tão altos.” Em outubro, seis em cada dez brasileiros estavam endividados, de acordo com a Confederação Nacional do Comércio.
7. Abandone os falsos ganhos
No caminho entre a bilheteria do cinema e a sala de projeção, sempre haverá comida. A localização é estratégica, e os preços também. Você até poderia assistir ao filme com um pacote de pipoca menor que sua cabeça, não? Mas por que comprar a porção pequena, se a gigante custa quase o mesmo, certo? Esse tipo de raciocínio guloso se chama “impressão de ganho”. É a ideia de que sempre vale a pena comprar a opção maior ou mais itens, se o acréscimo de preço parecer pequeno. Dan Ariely, professor de economia comportamental na Universidade Duke, nos Estados Unidos, afirma que o ser humano mede valores usando comparações e buscando vantagens relativas. Essa vantagem aparente pode ser enganosa. Enquadram-se, nessa categoria, as liquidações com preços ótimos, mas de itens que você não quer. E as ofertas de “leve dez e pague nove”, quando você poderia se contentar com “leve dois e pague dois”. Isso ocorre também em investimentos. A segunda modalidade preferida do brasileiro é o título de capitalização, de acordo com a empresa de pesquisas Fractal (a primeira é a poupança). O cérebro do guloso entende que o título de capitalização oferece duas “mercadorias”, o rendimento e o sorteio. Pague um e leve dois. No caso, um rendimento baixo e uma chance minúscula de ganhar. Ganhos falsos? Pule fora.
No caminho entre a bilheteria do cinema e a sala de projeção, sempre haverá comida. A localização é estratégica, e os preços também. Você até poderia assistir ao filme com um pacote de pipoca menor que sua cabeça, não? Mas por que comprar a porção pequena, se a gigante custa quase o mesmo, certo? Esse tipo de raciocínio guloso se chama “impressão de ganho”. É a ideia de que sempre vale a pena comprar a opção maior ou mais itens, se o acréscimo de preço parecer pequeno. Dan Ariely, professor de economia comportamental na Universidade Duke, nos Estados Unidos, afirma que o ser humano mede valores usando comparações e buscando vantagens relativas. Essa vantagem aparente pode ser enganosa. Enquadram-se, nessa categoria, as liquidações com preços ótimos, mas de itens que você não quer. E as ofertas de “leve dez e pague nove”, quando você poderia se contentar com “leve dois e pague dois”. Isso ocorre também em investimentos. A segunda modalidade preferida do brasileiro é o título de capitalização, de acordo com a empresa de pesquisas Fractal (a primeira é a poupança). O cérebro do guloso entende que o título de capitalização oferece duas “mercadorias”, o rendimento e o sorteio. Pague um e leve dois. No caso, um rendimento baixo e uma chance minúscula de ganhar. Ganhos falsos? Pule fora.